A rede varejista acaba de lançar Bettergoods, sua marca própria para produtos diferenciados, mais saudáveis e sofisticados
Quando o maior varejista do planeta decidiu emplacar um grande empreendimento, precisamos acompanhar com atenção.
O Walmart, maior empresa de varejo do mundo, com o impressionante faturamento de mais de 3 trilhões de reais (valor superior ao PIB da maioria dos países), decidiu fazer uma grande aposta, daquelas capazes de ter enorme influência no próprio consumo dos Estados Unidos.
O Walmart acaba de lançar Bettergoods – sua marca própria para produtos diferenciados, mais saudáveis e sofisticados. Entre os produtos que serão oferecidos, destacam-se produtos à base de plantas, “livres de” (aqueles que não apresentam algum ingrediente específico – como o glúten), com novos sabores, texturas e conceitos culinários.
A empresa promete fazer um sourcing global para levar aos americanos o que há de melhor no mundo, com a intenção de democratizar o consumo de alta qualidade, dando acesso a produtos que não costumam estar na mesa do consumidor médio americano.
Um panorama do competitivo mercado americano
Para entender as motivações do Walmart para essa empreitada, é importante analisar a situação do mercado onde a empresa está inserida. O Walmart enfrenta a agressiva concorrência da Amazon, que há anos cresce em ritmo mais acelerado.
Outra concorrência feroz é a das chamadas “dollar stores”, como as redes Dollar Tree e Dollar General, cada uma com mais de 20.000 lojas espalhadas nos Estados Unidos. Além dessas, também enfrenta a concorrência da rede alemã Aldi, que entrou com essa bandeira em território americano em 1976, em Iowa, e em seguida adquiriu a rede Trader Joe´s. Hoje, já opera cerca de 3.000 lojas nos Estados Unidos. Em comum a todas essas redes está o grande foco em produtos de marcas próprias.
O mundo evolui de forma inequívoca para um consumo mais qualificado, com clientes testando novas receitas e sabores, arriscando novas marcas e se dedicando a ler rótulos. Os consumidores estão dispostos a conhecer o que há de melhor no mundo e o comércio globalizado possibilita a oferta de novas escolhas e acesso a produtos de nicho.
Para enfrentar o avanço de marcas próprias, com as do Aldi, o Walmart chegou a lançar no final de 2013 a marca First Price. Sua aposta é que as marcas de seus concorrentes possuíam preços inferiores por oferecer menor qualidade. Grande equívoco. Lançou esta marca para se posicionar abaixo de sua marca com maior protagonismo, a Great Value.
A First Price oferecia embalagens azuis e muito simples. Para sermos justos, é importante dizer que as embalagens eram sofríveis. Parecia querer impor aos seus clientes o direito a um produto mais barato caso eles tivessem despidos da pretensão de comprar produtos com embalagens atraentes. Porém, a qualidade inferior pareceu ter desagradado mais que o visual das embalagens. A marca foi descontinuada pouco tempo depois, em 2016. Nunca decolou.
Walmart e a sua relação com as grandes indústrias nacionais
O Walmart não é a melhor referência em construção de marcas de valor. Na verdade, a empresa é reconhecida por sua relação profunda com os fabricantes das grandes marcas de mercado (como a Procter & Gamble), por acreditar na força das chamadas “marcas nacionais” e por oferecer uma variedade de opções de marcas para seus clientes.
É bem verdade que a empresa vende um volume gigantesco com suas marcas, com maior destaque para a marca Great Value, no entanto, a empresa nunca se dedicou a fazer um fortalecimento e construção relevante da imagem de suas marcas – tornando-as o que os marqueteiros chamariam de fancy brands.
Bettergoods, por outro lado, pode ser um marco na história das marcas da empresa sediada em Bentonville, Arkansas. Ela tem o potencial de introduzir na casa de milhões de americanos produtos mais elaborados e com origem nos lugares mais remotos no planeta a preços justos, oferecendo experiências culinárias memoráveis.
O Walmart quer atrair um consumidor de mais alta renda que resiste a visitar suas lojas e que prefere, por exemplo, as lojas da rede Target que, por sinal, vem há alguns anos construindo uma marca incrível que se chama Good & Gather.
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A varejista terá que evitar os erros, e até o descaso, do passado em relação a privilegiar e comunicar sua nova marca. Vai ter que lutar contra a sua essência marquista, ou seja, de privilegiar sempre as grandes marcas de mercado. Terá que ter convicção de que sua nova marca pode ser tão grande quanto qualquer outra do mercado e cativar o coração dos consumidores americanos.
Desafios da nova linha de produtos Bettergoods
A assertividade na escolha do nome de sua mais nova marca é duvidosa: Bettergoods. A empresa insiste em trazer um significado para o naming vinculado ao valor que quer entregar. Poderia ter escolhido um nome que não oferecesse qualquer referência ao posicionamento de qualidade, permitindo a construção de um significado do zero, a exemplo do que fez TAEQ, do Grupo Pão de Açúcar, no Brasil. Mas, na verdade, não vai ser esse o maior desafio.
Como qualquer marca de sucesso, a Bettergoods vai depender de uma grande execução no ponto de venda. Para isso, precisará dos melhores produtos, prioridade de suas equipes comerciais, excelência na comunicação da marca e presença imponente em cada uma de suas lojas. Feito isso, os americanos ganharão um grande presente: desfrutar de uma maior variedade de refeições saudáveis e sofisticadas.
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